Mas isso é um fator contraditório. Visto que nenhum indivíduo é uma ilha e não nascemos sabendo tudo, então, a figura do mestre se faz necessária, mesmo diante da questão de que somente o próprio indivíduo deveria ser capaz de se guiar e de crescer. O que pensar então?
O mestre é, ou deveria ser, alguém que já trilhou o caminho que apresenta e portanto acredita-se que este seja capaz de sanar dúvidas e direcionar corretamente o indivíduo para o alvo em questão. Contudo sabemos bem que em meio a milhões salvam-se dois ou três que tem de fato interesse real em auxiliar e não somente masturbar o próprio ego. E há de se afirmar que muitos destes dois ou três nem ao menos encaram-se como mestres de fato.
Isso é interessante. As instituições, sejam elas discretas ou não, implicam que para alcançar determinados níveis você é capaz de lidar com tudo o que for relacionado ao seu posto e aos postos anteriores. Ter o respaldo de uma instituição (fraternidade, etc) é de fato muito interessante. Mas convenhamos que a arte do ensino é habilidade de poucos indivíduos, e que para esse campo do universo humano não basta somente saber passar adiante informações e sim ter ciência real daquilo em que se dispõem a transmitir.
pseudo mestres |
Se em meio a estes letrados das ciências ocultas "o buraco é mais embaixo" imaginemos então quando passamos a avaliar tantos gurus ou mestres das trocentas vertentes espiritualistas naturais. O xamanismo, grupos de magia natural e várias correntes que desenvolvem seus ritos e ensinamentos sem necessariamente possuírem um dogma ou uma instituição organizada dando suporte correm um risco maior de apresentarem seus caminhos por intermédio de indivíduos que tem objetivos muito mais sórdidos por trás e ai percebemos uma grande armadilha que todos os buscadores sinceros hão de enfrentar mais cedo ou mais tarde.
Não basta pensarmos que a espiritualidade devolve o que fazemos em dobro, triplo ou seja lá quanto for; antes disso esse tal "mestre" já desvirtuou o caminho de vários possíveis grandes criadores e isso é uma lástima. Não basta pensarmos que isso é mais um aprendizado para o neófito e que este se fortalecerá no futuro, nada garante isso. O que de fato deveríamos pensar então? Claro, numa saída:
- E a primeira é nunca, em momento algum, baixar a cabeça para quem quer que seja. Para recebermos um ensinamento ou conhecimento não precisamos nos colocar em posição de servo. Isso é coisa de religiões patriarcais e é muito vil. Esse ato de servilidade é uma porta bestial que dará acesso ao nosso universo interno por indivíduos muitas vezes inescrupulosos. Um verdadeiro mestre em momento algum se permitiria a fazer isso, deixando ao acaso da natureza, um dia qualquer ser aberto naturalmente o caminho. E se também não for isso não deverá ser um problema. Há de se refletir que humildade ou simplicidade são coisas bem distintas de servilidade.
- Outra coisa é nunca acreditar cem por cento no que um indivíduo diz. Provavelmente um mestre de verdade nem ao mesmo terá pretensão disso, indicando ao neófito que para ele angariar tal e tal informação é necessário buscar por si mesmo. O ato de acreditar piamente no que outra pessoa diz é ingenuidade e normalmente levará a vários erros. Os mundos internos tem sua lógica em comum, mas os símbolos e mecanismos para adentra-lo são bem distintos um dos outros. Para uns saber um aforismo já é suficiente para se ter uma epifania, para outros anos de estudo não fazem nem ao menos passar pela porta de casa. Isso já é um demonstrativo de que não existe uma cartilha para mestres, e que estes sujeitos provavelmente são tão medíocres quanto qualquer outro indivíduo, ou até mesmo piores.
- Outra possível atitude é observar os outros neófitos, principalmente os mais próximos destes ditos mestres. Estes neófitos, como alguns animais de estimação, fatalmente agirão exatamente igual ao seu foco de atenção, nesse caso o guru. Eles demonstrarão cedo ou tarde todas as qualidades e defeitos deste mestre e facilmente reconheceremos, já que estes são neófitos e não tem habilidade suficiente na maioria das vezes para disfarçar. Contudo é necessário cautela, visto que parte destas atitudes podem ser do próprio neófito, mas a observação já valerá a pena.
Isso implica em sermos claramente paranoicos (do modo mais positivo possível), para sempre sabermos bem aonde estamos. Contudo isso é de fato garantia de que conseguiremos reconhecer um mestre de verdade de outro?
Provavelmente não. Na verdade essa busca por um mestre e guru é em si muito tola. Quantas e quantas vezes não nos deparamos com situações onde alguém surge, fala algo simples ou não e aquilo ensina muito mais do que todos os acontecimentos ao longo dos anos? E logo em seguida esse mesmo indivíduo vai embora. O que isso implica?
ôba-ôba |
Sabendo que é preciso compreender que mestre e instrutor são coisas bem distintas e que na maioria das vezes precisamos muito mais de um instrutor do que de um mestre. Digo isso por que o peso de chamar alguém de mestre é suficiente para fazer surgir em pessoas fracas todo tipo de atitudes tolas e egoístas. Além de criar uma realidade fantasiosa em torno do indivíduo que se ele não tiver escrúpulos poderá e provavelmente fará uso disso da pior forma.
Sendo assim temos consciência de que boa parte deste caminho é uma tarefa solitária, onde vez ou outra nos encontramos com um ou outro e comungamos. E por isso mesmo agora implico que mestres, provavelmente já tivemos vários. Mas nem ao menos percebemos, por que estes não se fizeram perceber desta forma, não há necessidade, nem para o neófito (apesar de criar todo um clima), nem para quem instrui.
Mestre Irineu |
Trato deste ponto agora para mais a frente tratar de outro ponto muito importante nas linhas naturais, onde a utilização de psicotrópicos, psicoativos, enteógenos é delegada a certos instrutores (ditos mestres) que manipulam uma substância que requer dentre outras coisas extremo respeito e sabedoria. Como no caso do DMT (onde aqui um dos ritos mais conhecidos é chamado por DAIME) que advém de uma tradição indígena, provavelmente dos índios amazônicos, onde em meados da década de 20 foi absorvida pelo maranhense, hoje conhecido como Mestre Irineu. E por fim o que ele fez foi pegar a ayahuasca e cristianizar a utilização (além de adicionar outras tantas coisas) criando um culto sincrético que vem se expandindo desde então promovendo a cura dos seus utilizadores.
Há de se ressaltar que em nenhum momento, ao tratar de mestres e gurus implico que Mestre Irineu se encaixe de fato nos grupos dos charlatães. Muito pelo contrário. A história do Mestre Irineu é muito interessante e vale ser conhecida e provavelmente este faça parte daqueles dois ou três citados anteriormente. Contudo isso não significa em momento algum que o que ele criou, ou melhor, desenvolveu junto ao já existente consumo da ayahuasca pelos índios Xamãs (diga-se de passagem já era pelo objetivo de expandir a consciência e em prol da cura), seja de fato um método perfeito e livre de qualquer erro. É bem provável que ele mesmo não acreditasse nisso, nessa perfeição, mas sua inspiração e visão levou-o a se tornar um símbolo para o movimento que desenvolveu a partir de sua vivência.
Isso implica que o DAIME, por mais que promova a cura e de fato realiza-a em meio aos seus utilizadores não necessariamente possua os melhores métodos de utilização ou de ritualização (isso não significa que o rito não seja belo ou mesmo não seja eficaz). Por exemplo, um ponto muito simples e bem claro: há uma carga cristã da qual para mim não é necessária, mas isso é meu caso e explico o por que: o cristianismo é muito belo, enquanto só levarmos em conta as palavras do Cristo, mas convenhamos que o que se tornou o cristianismo é de longe a coisa mais positiva do mundo. Sendo assim eu mesmo, que já participei de ritos com ayahuasca, reconheço que enfrentar o voou escutando uma música que em certo ponto eu discordo categoricamente ou que me deixará ao menos pesaroso ou mesmo depressivo não faz sentido algum. Mas claro isso pode ser relevado facilmente se o indivíduo se permitir (ou por ser ele um cristão) ou se o objetivo de utilizar tais músicas (hinos) seja de fato algo consciente, objetivando atingir os participantes de um modo específico, mas sabemos bem que na maioria das vezes é bem provável que não seja isso e sim a velha tradição que se arrasta ao longo do tempo sem um dedo de evolução ou adaptação. Claro que há muitos hinos que exaltam o autoconhecimento e a busca da cura e iluminação, mas não são todos, alguns são um tanto quanto deprimentes.
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E claro, não é por que o Mestre Irineu foi um mestre que os seus sucessores estão tendo algum tipo de sucesso real (o contrário também ocorre e provavelmente muitos estão tendo sucesso). Mas como falei, isso é um assunto posterior.
Sendo assim o que concluo aqui é que mestres de fato existem nas histórias que lemos e servem mais para nos inspirar a sermos um dia mestres de nós mesmos. E que podemos estar sendo mestres na vida de alguém, mas isso não implica que somos especiais, ou que de fato somos melhores. É bem provável que o outro, que tenha recebido nossa informação e instrução seja mais cedo ou mais tarde nossos mestres também, nos ensinando algo do qual não somos capazes de perceber no momento.
Portanto pare de esperar o mestre chegar e comece a estudar e praticar e se um dia lhe for permitido transmitir algo, seja humilde o suficiente para perceber que todos estes que receberam suas palavras podem muito bem rapidamente ensinar-lhe algo tão intenso quanto.
Sendo assim... Somos todos mestres, somos todos neófitos... estamos todos sozinhos em busca de autorrealização. Sejamos todos humildes para receber e transmitir sem que isso nos faça estufar o peito arrogantemente como se o universo tivesse nos escolhido e ao resto não. Tolo o ser humano que buscar glórias deste modo por que é um indivíduo encarcerado e sem visão.
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sinta-se à vontade para comentar, sua opinião é sempre muito bem vinda.
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